quinta-feira, 20 de maio de 2010

Mário de Sá-Carneiro


Passaram ontem 120 anos exactos sobre o nascimento de um dos mais importantes escritores portugueses do século XX. Incompreendido, durante a sua curta vida, por quase todos e até por si mesmo, Mário de Sá-Carneiro tem vindo pouco a pouco a ser reabilitado enquanto figura central, a par de Fernando Pessoa, do Modernismo literário português. Foi um dos mentores e impulsionadores de Orpheu, procurou viver à escala de um cosmopolitismo que não o redimiu dos seus fantasmas e da sua profunda fragilidade. Acabou por morrer aos 26 anos, por sua vontade, sozinho, em Paris. Manteve com Fernando Pessoa uma correspondência intensa e reveladora das suas preocupações artísticas e da debilidade emocional que acabou por o arrastar para a morte. Ficaram os seus poemas, ficções e peças de teatro. Deixamos aqui, em jeito de homenagem, um dos seus poemas em que a consciência do fim já parece estar presente:
A Queda
E eu que sou o rei de toda esta incoerência,
Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la
E giro até partir... Mas tudo me resvala
Em bruma e sonolência.

Se acaso em minhas mãos fica um pedaço de ouro,
Volve-se logo falso... ao longe o arremesso...
Eu morro de desdém em frente dum tesouro,
Morro á mingua, de excesso.

Alteio-me na côr à fôrça de quebranto,
Estendo os braços de alma - e nem um espasmo venço!...
Peneiro-me na sombra - em nada me condenso...
Agonias de luz eu vibro ainda entanto.

Não me pude vencer, mas posso-me esmagar,
- Vencer ás vezes é o mesmo que tombar -
E como inda sou luz, num grande retrocesso,
Em raivas ideais, ascendo até ao fim:
Olho do alto o gêlo, ao gêlo me arremesso...

. . . . . . . . . . . . . . .

Tombei...
         E fico só esmagado sobre mim!...

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